Transparental?

Será que não há uma operação qualquer que me transforme numa transparental? Tenho andado para aqui a pensar e acho que era o melhor.
Transsexual não me dava lá muito jeito, que habituei-me a ser gaja e fazer xixi de pé não é propriamente uma das minhas ambições, mas passar de mãe a pai até que era capaz de me agradar.
Ontem dei por mim a fazer contas e cheguei à assustadora conclusão que este vai ser o 17º Verão da minha vida que vou com crianças para a praia. O 17º Verão que não sei o que é ler um livro ao sol sem ter de arranjar uma sandes de cinco em cinco minutos. O 17º Verão que não posso ir para os copos se não conseguir despachar as crianças nunca sei muito bem para onde, ou que não as despacho e fico a maldizer quem tantos filhos fez.
Sou assim a modos como a pescada, que antes de o ser já o era, que a minha filha mais velha tem 13 anos, não 17... Mas hoje lembrei-me do Verão de há 17 anos e da casa da Galé, e dos meus amigos que me convidaram para passar quinze dias, e de como lá apareci com ele e a criança. E da noite do churrasco e de toda a gente a meter-se nos carros para ir para Vilamoura e eu, solidariamente, decidida a ficar em casa, que se o miudo estava doente o pai não ia ficar sozinho a fazer de babysitter. E de como o apanhei a ele, ao pai, a entrar num dos carros prontinho para ir embora que se eu ficava ele podia ir, que não era preciso ficarmos os dois...
Ser pai. É mesmo a minha ambição.
Duas filhas e dezassete anos depois começo a perceber que se tivesse parido as nove criancinhas que queria sempre tinha sido mais fácil, que os sacaninhas já tomavam conta uns dos outros. Assim, continuo eu armada em mãe e a fritar os douradinhos, que eu fui comprar, que eu carreguei e que eu tive de pagar, quando não estou mesmo com vontade de fazer a caldeirada que elas gostam.
A nossa vida é estranha. Se me tivessem dito, a mim, que sempre gostei de bater com a porta e ir saindo, que iria ter 17 anos da minha vida completamente condicionados por crianças, só poderia ter desatado a rir. E afinal, aqui estou. Quase desvairada, como se pode verificar fácilmente, mas sem conseguir, sem querer e sem poder arredar pé.
Uma coisinha aqui, outra ali, mais outra acolá, e cá estou eu a ir ao supermercado num instantinho que elas já ficam sozinhas, mas ainda não é por muito tempo.
E pais, escusam de dizer que são diferentes. Eu sei que são, que há pais e pais, mas desculpem a franqueza, no fundo no fundo a responsabilidade nunca é vossa.
Ontem estava no msn com o filho de um amigo meu. O miudo estava a querer saber porque eu não ia para a praia com as gaijinhas, que ele estava metido em casa em Lisboa e se estivesse aqui estaria era a dar uns bons mergulhos. Passado pouco tempo recebi uma mensagem do pai dele. Estava na praia! É bom gajo, muito bom, das pessoas mais decentes que conheço, mas de certeza que nem lhe passou pela cabeça levar os filhos com ele quando decidiu ir para a praia a meio da tarde. É pai, pronto! Se os miúdos estão com a mãe nem lhe passa pela cabeça preocupar-se. Comigo, ou qualquer outra mãe, de certeza que teria sido o primeiro pensamento - e as crianças?
Gaita para estas hormonas, ou lá o que é!
Ser pai, já disse, é o sonho da minha vida!
Gosto muito das minhas filhas, mas será que não me podiam começar a chamar papá?

15 comentários:

@na disse...

só me ocorre:
1. Tens toda a razão!!!
2. Ahahahahahaha
3. 'rais parta o útero...

jbettpinto disse...

Ao menos, ensina às tuas filhas que, na vida, lato sensu,têm os mesmíssimos direitos e deveres que os rapazes!
Já alguma vez te questionaste sobre o imenso disparate que é: o Pai, o Filho, e o Espirito Santo?
Onde é que ficou a Mulher?

@na disse...

em casa a coser meias... quer-me parecer...

Teresa disse...

As minhas filhas vão sendo ensinadas, nem que seja pela vida, que sempre viram a mãe a fazer tudo, desde mudar o pneu do caro até andar à chapada com os rufias lá da escola. Os filhos dos outros já não sei.
Quanto ao Pai ao Filho e ao Espírito Santo é clássico - a mulher estava a provar a maçã e depois no estábulo a tomar conta da criancinha.

Anônimo disse...

Aposto que aí no início da história o filho era só dele e não teu. Tenho razão? É que tu só tens duas filhas. E ele deu à sola. E os amigos eram teus? Típico.......
Eu também sou das que serve primeiro os filhos, já do pai não direi o mesmo...

Teresa disse...

Very tipical, very potuguese...

@na disse...

very cobardolas!

gaija do norte disse...

eu tento educar o meu rapaz da melhor forma, e sempre cheia de duvidas. tenho pavor que se torne num homem "imprestável" sem saber assumir e dividir responsabilidades, sem saber tratar de si e dos que o rodeiam, sejam eles quem forem! é verdade que ainda lhe sirvo a pêra descascada e partida aos bocadinhos, como ele gosta, mas recebo em troca jantares fantásticos: umas sandes de se lhe tirar o chapéu (bem, a ultima tinha pasta de alho em vez de molho de alho! o hálito afugentava qualquer vampiro...)! já conheci pais que vivem sozinhos com os filhos e são exemplares. passam por tudo que nós, mães praticamente solteiras, passam, mas são raros. pelo menos existem, não é? e enquanto há vida há esperança:)

Teresa disse...

Já nem falo só em educação, mas no "estupor" deste instinsto maternal que nos faz sempre chegar à frente. Mesmo que os pais sejam o mais presentes e intervenientes possível (sim, que sei que os há, mas nunca vi nenhum...).
Pais solteiros, Gaija? Conheço alguns. Até sei de uma história gira. A de um que foi entrevistado por uma revista de grande informação para uma reportagem sobre as dificuldades de ser pai solteiro. Foi engraçado ouvir um pai a descrever as dificuldades de criar um filho sozinho. Mais engraçado foi vê-lo a tirar as fotos da praxe sentado com o filho no sofá lá de casa,da minha casa, onde viviam há uns anos, enquanto eu esperava que acabasse a triste história para finalmente podermos jantar. Sim, claro, eu já tinha ido buscar a criança à escola, dado banho, feito o jantar, ido ao supermercado, arranjado a roupa para a escola do outro dia e essas coisinhas que se fazem. Mas pai solteiro, claro!
Eu era obrigada? Não. Mas a demissão total de uma das partes e o maldito instinto da outra leva a que isto aconteça. E agora, com 13 anos de vida sozinha com as miúdas a última coisa que quero ouvir é um gajo a dizer sou pai e elas são minhas filhas, porque me apetece logo responder - pai, o caraças!
(epá, hoje estou mesmo com mau feitio. deve ser do vento lá fora)

gaija do norte disse...

um pai que não vive com os filhos, nunca se pode sentir pai a 100%. o mesmo digo das mães, claro. as pequenas grandes coisas do dia à dia, as birras, as idas à escola sempre, sempre que acontece alguma coisa, o acordar, o deitar, as refeições, as roupas, os livros, o mantê-los bem dispostos 6 dias por semana, todas as semanas do ano, são mesmo coisas de mãe... e sabes o que é que me irrita? é quando penso "tenho que ser eu a fazer ou mais ninguém faz". será que não faz mesmo? ou será que sou eu que não me demito de alguns itens inerentes ao estupor do instinto maternal? tenho duvidas...

(será que estou a ficar soft? deve ser da falta de vento eheheh)

Teresa disse...

Olha, eu demito-me já. Por quinze dias, mas demito-me. Queres experimentar? Deixamos as crianças com os progenitores e vamos de férias. Sempre era uma experiência nova.

gaija do norte disse...

vamos! é já!!!

@na disse...

cof...cof.. também posso?

Teresa disse...

Gostas de minis? Então 'bora...

Tenho uma amiga alemã, também mãe sozinha e com duas filhas, que diz que ainda não desistiu da ideia de arranjar por aí um monte, com duas casa, para vivermos com as crianças respectivas (acho que a casa com a cozinha grande era para mim...). Se se quiserem juntar à comunidade é só dizerem que quem diz duas casas diz três ou quatro...

@na disse...

ahhh passa a ser uma aldeia... parece-me bem, sempre ouvi dizer que para criar uma criança é preciso uma aldeia.