Pedófilo? Começo logo por embirrar com o nome.
A palavra pedofilia vem do grego παιδοφιλια < παις (que significa "criança") e φιλια ( 'amizade'; 'afinidade'; 'amor', 'afeição', 'atração).
Tiremos então as crianças e o amor da conversa, que não me parece que fiquem bem acompanhados, e juntemos crápula, ou filho da puta, ou besta, ou um mimo do género.
Ou não?
Tudo isto me tem andado para aqui a bailar desde que, de manhã, li esta notícia:
O CDS-PP leva hoje a debate na Assembleia da República um projecto de lei que visa mudar a lei que permite a limpeza do cadastro a todos os condenados por pedofilia ou maus-tratos, cinco a dez anos após o cumprimento das penas.
Em declarações à TSF, a deputada Teresa Caeiro explicou que a iniciativa «prende-se com o não cancelamento do registo de decisões sob o crime de maus-tratos ou crime contra a liberdade pessoal quando a vítima seja menor».
Com a manutenção do cadastro, os centristas procuram impedir que os abusadores de menores possam vir a adoptar crianças após verem os seus crimes desaparecem dos seus registos criminais cinco ou dez anos após o cumprimento da pena.
A procissão tinha acabado de sair para o adro, mas já se lhe juntavam andores de outras confrarias:
Partido no Governo, o PS mostrou-se, esta segunda-feira, disponível para mudar a lei que permite a limpeza de cadastro a um condenado por pedofilia, conforme propõe o CDS-PP...
E é aqui, quando esta coisa dos amigos das crianças, ou sacanas, ou lá como eles se chamam, se começa a misturar com penas e cadastros e registos para a vida, que a minha confusão se instala.
Então estamos a falar de criminosos? Julgados e condenados e de pena cumprida? Parece que sim, que registo no cadastro é isso mesmo. Mas achamos que vão continuar a cometer crimes e por isso não lhes limpamos os registos, para o pessoal ficar avisado?
Parece-me que temos aqui um embrulho que ninguém quer desatar e onde se limitam a colar os cantitos já rasgados.
Tratamos os tais pedófilos como criminosos comuns. O crime está previsto no nosso Código Penal e a moldura penal estipulada é aquela que o nosso legislador considerou adequada. Quando os apanhamos, julgamos e, se tudo correr de feição, acabam com os costados na cadeia. Quanto tempo? O tempo que, dentro daquele que está previsto para o crime, a tal moldura penal adequada, o Tribunal ache correcto, que nisso o legislador também foi peremptório:
Codigo Penal
Artigo 43º
Execução da pena de prisão
1 - A execução da pena de prisão, servindo a defesa da sociedade e prevenindo a prática de crimes, deve orientar-se no sentido da reintegração social do recluso, preparando-o para conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes.
2 - ...
E lá começo eu outra vez a fazer contas de cabeça. Então os nossos iluminados legisladores mataram-se a pensar para descobrir a tal pena adequada, nós matamo-nos a trabalhar para pagar a estes muito altruístas amigos das crianças uma estadia com tudo pago num estabelecimento que, se não é de luxo, serve pelo menos as refeições a horas certas, e agora vêm dizer que tudo isso não vale nada e que à saida estão tão brancos e puros como à entrada?
Não limpar um cadastro de um pedófilo para evitar uma possivel, e futura, adopção de uma criança é reconhecer, assim, preto no branco, que o perigo que ele representa não está resolvido. Mas quantos deles querem adoptar crianças? Sabemos que são amigos delas, mas uma criança custa a criar. Talvez que os que andem com essa fisgada, sei lá, para se redimirem do mal, sejam no mesmo número daqueles que resolvem ir dar aulas, que podem ter muito a ensinar, ou vigiar uma colónia de férias, ou trabalharem num parque infantil, ou conduzirem o autocarro da escola, ou serem ministros da républica.
Ou mesmo, quem sabe, resolverem ser meus vizinhos. Ou vossos.
Vamos começar a fazer o quê? Empreste-me uma chávena de açúcar, mas mostre lá o registo criminal primeiro?
Onde é que estes, que querem deixar as letrinhas todas escritas no cadastro, foram buscar a ideia peregrina que pedófilo vai continuar a ser pedófilo mesmo depois de ter cumprido aquela pena tão justa e equilibrada e pedagógica? E que é preciso ter cuidado com eles?
Terá sido aqui?
A pedofilia é classificada como uma desordem mental e de personalidade do adulto, e também como um desvio sexual, pela Organização Mundial de Saúde[2].
Pois, se calhar, foi mesmo.
Mas se assim é, e até concedo que seja, o que andamos nós a fazer? Julgamentos morais? Você é uma besta, o que fez foi horrível, e nós temos de lhe dar um castigo, mas como somos civilizados não lhe limpamos o sebo nem deixamos que apodreça na cadeia. Vai para lá uns anos, volta e contas arrumadas até fazer outra. E agora, pelo sim pelo não, ficamos a chamar-lhe criminoso para o resto da vida.
É esta imensa hipocrisia que me revolta. Sabemos, porque já nos disse quem sabe, que os tipos não são bons da cabeça, mas continuamos a tratá-los, ou a não os tratar, como se fossem.
Desordem mental? Então que se ordene outra vez. Ou que se tente ordenar. Quero lá saber se isso é feito num estabelecimento com um bocadinho de mais luxo que os outros, em casa, numa clínica privada ou na Ilha do Diabo. Quero lá saber se demoram um mês, um ano, ou vinte a acertarem-lhes as agulhas. Quero lá saber se a doença é incurável e ficam em tratamento para o resto das vidinhas.
O que eu queria é que nos deixássemos de histórias, e do se te apanho a fazer isso levas umas palmadas do pai estado, e que começássemos a resolver o problema. A sério. Se esta gente é um perigo, resolvam-no. Não me venham é tentar convencer que as minhas filhas e os vossos filhos ficam muito mais seguros porque o cadastro dos gajos não é limpo. Olhem para mim, a dar pulos de contente, e a dizer bem feita!, bem feita!, podem andar por aqui a passear, mas o vosso cadastro está quase tão sujo como a vossa cabeça, que nós somos muito espertos!
Estão doentes? Tratem-se. Não querem? Eu, pelo menos, quero que o façam e, enquanto puder, é isso mesmo que grito - Tratamento compulsivo, já!
A palavra pedofilia vem do grego παιδοφιλια < παις (que significa "criança") e φιλια ( 'amizade'; 'afinidade'; 'amor', 'afeição', 'atração).
Tiremos então as crianças e o amor da conversa, que não me parece que fiquem bem acompanhados, e juntemos crápula, ou filho da puta, ou besta, ou um mimo do género.
Ou não?
Tudo isto me tem andado para aqui a bailar desde que, de manhã, li esta notícia:
O CDS-PP leva hoje a debate na Assembleia da República um projecto de lei que visa mudar a lei que permite a limpeza do cadastro a todos os condenados por pedofilia ou maus-tratos, cinco a dez anos após o cumprimento das penas.
Em declarações à TSF, a deputada Teresa Caeiro explicou que a iniciativa «prende-se com o não cancelamento do registo de decisões sob o crime de maus-tratos ou crime contra a liberdade pessoal quando a vítima seja menor».
Com a manutenção do cadastro, os centristas procuram impedir que os abusadores de menores possam vir a adoptar crianças após verem os seus crimes desaparecem dos seus registos criminais cinco ou dez anos após o cumprimento da pena.
A procissão tinha acabado de sair para o adro, mas já se lhe juntavam andores de outras confrarias:
Partido no Governo, o PS mostrou-se, esta segunda-feira, disponível para mudar a lei que permite a limpeza de cadastro a um condenado por pedofilia, conforme propõe o CDS-PP...
E é aqui, quando esta coisa dos amigos das crianças, ou sacanas, ou lá como eles se chamam, se começa a misturar com penas e cadastros e registos para a vida, que a minha confusão se instala.
Então estamos a falar de criminosos? Julgados e condenados e de pena cumprida? Parece que sim, que registo no cadastro é isso mesmo. Mas achamos que vão continuar a cometer crimes e por isso não lhes limpamos os registos, para o pessoal ficar avisado?
Parece-me que temos aqui um embrulho que ninguém quer desatar e onde se limitam a colar os cantitos já rasgados.
Tratamos os tais pedófilos como criminosos comuns. O crime está previsto no nosso Código Penal e a moldura penal estipulada é aquela que o nosso legislador considerou adequada. Quando os apanhamos, julgamos e, se tudo correr de feição, acabam com os costados na cadeia. Quanto tempo? O tempo que, dentro daquele que está previsto para o crime, a tal moldura penal adequada, o Tribunal ache correcto, que nisso o legislador também foi peremptório:
Codigo Penal
Artigo 43º
Execução da pena de prisão
1 - A execução da pena de prisão, servindo a defesa da sociedade e prevenindo a prática de crimes, deve orientar-se no sentido da reintegração social do recluso, preparando-o para conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes.
2 - ...
E lá começo eu outra vez a fazer contas de cabeça. Então os nossos iluminados legisladores mataram-se a pensar para descobrir a tal pena adequada, nós matamo-nos a trabalhar para pagar a estes muito altruístas amigos das crianças uma estadia com tudo pago num estabelecimento que, se não é de luxo, serve pelo menos as refeições a horas certas, e agora vêm dizer que tudo isso não vale nada e que à saida estão tão brancos e puros como à entrada?
Não limpar um cadastro de um pedófilo para evitar uma possivel, e futura, adopção de uma criança é reconhecer, assim, preto no branco, que o perigo que ele representa não está resolvido. Mas quantos deles querem adoptar crianças? Sabemos que são amigos delas, mas uma criança custa a criar. Talvez que os que andem com essa fisgada, sei lá, para se redimirem do mal, sejam no mesmo número daqueles que resolvem ir dar aulas, que podem ter muito a ensinar, ou vigiar uma colónia de férias, ou trabalharem num parque infantil, ou conduzirem o autocarro da escola, ou serem ministros da républica.
Ou mesmo, quem sabe, resolverem ser meus vizinhos. Ou vossos.
Vamos começar a fazer o quê? Empreste-me uma chávena de açúcar, mas mostre lá o registo criminal primeiro?
Onde é que estes, que querem deixar as letrinhas todas escritas no cadastro, foram buscar a ideia peregrina que pedófilo vai continuar a ser pedófilo mesmo depois de ter cumprido aquela pena tão justa e equilibrada e pedagógica? E que é preciso ter cuidado com eles?
Terá sido aqui?
A pedofilia é classificada como uma desordem mental e de personalidade do adulto, e também como um desvio sexual, pela Organização Mundial de Saúde[2].
Pois, se calhar, foi mesmo.
Mas se assim é, e até concedo que seja, o que andamos nós a fazer? Julgamentos morais? Você é uma besta, o que fez foi horrível, e nós temos de lhe dar um castigo, mas como somos civilizados não lhe limpamos o sebo nem deixamos que apodreça na cadeia. Vai para lá uns anos, volta e contas arrumadas até fazer outra. E agora, pelo sim pelo não, ficamos a chamar-lhe criminoso para o resto da vida.
É esta imensa hipocrisia que me revolta. Sabemos, porque já nos disse quem sabe, que os tipos não são bons da cabeça, mas continuamos a tratá-los, ou a não os tratar, como se fossem.
Desordem mental? Então que se ordene outra vez. Ou que se tente ordenar. Quero lá saber se isso é feito num estabelecimento com um bocadinho de mais luxo que os outros, em casa, numa clínica privada ou na Ilha do Diabo. Quero lá saber se demoram um mês, um ano, ou vinte a acertarem-lhes as agulhas. Quero lá saber se a doença é incurável e ficam em tratamento para o resto das vidinhas.
O que eu queria é que nos deixássemos de histórias, e do se te apanho a fazer isso levas umas palmadas do pai estado, e que começássemos a resolver o problema. A sério. Se esta gente é um perigo, resolvam-no. Não me venham é tentar convencer que as minhas filhas e os vossos filhos ficam muito mais seguros porque o cadastro dos gajos não é limpo. Olhem para mim, a dar pulos de contente, e a dizer bem feita!, bem feita!, podem andar por aqui a passear, mas o vosso cadastro está quase tão sujo como a vossa cabeça, que nós somos muito espertos!
Estão doentes? Tratem-se. Não querem? Eu, pelo menos, quero que o façam e, enquanto puder, é isso mesmo que grito - Tratamento compulsivo, já!
18 comentários:
Por acaso, quando de manhã ouvi a notícia, pensei nisso exactamente.
Mas deixei-me estar calada que, da maneira que as coisas andam, ainda acabava eu a ser tratada compulsivamente por defender o indefensável, ou qualquer coisa do género...
Ou mudam a maneira de ver as penas, ou mudam as penas, ou vai toda a gente ter umas aulinhas de "teoria da pena". Quando andava na FDL disseram-me que havia uns alemães com umas ideias giras, que a Prof. citava no original, às vezes durante mais de 50 min seguidos... Como o meu alemão era fraquinho, auto-excluí-me, mas deve ter sido isso que me fez manter a sanidade penal.
A questão é complexa, como sabes muito bem. A tentativa até não é má de todo de fechar as portas a algumas lacunas na lei.
Mas o resolver a sério este problema exige uma determinação maior que a possível no estado actual da nossa legislação. Usam um band-aid e esperam que isto passe.
ângela,
Vou responder ao Santo e acho que assinas por baixo.
santo,
As leis, regra geral, até estão bem feitas. As lacunas, graves, são na cabeça de quem as aplica, quem as comenta e quem compra o Correio da Manhã e o 24 horas (e até meto os outros, os mais sérios, no pacote).
Se está demonstrado médicamente que a pedofilia é uma doença do foro psiquiátrico, não é preciso mais nada, band aid nenhum, para as nossas leis poderem ser aplicadas. Se não há "liberdade de escolha", se um pedófilo não consegue, por ser doente, controlar os instintos, então devia ser considerado inimputável e tratado como tal. A responsabilidade,dos actos de pedofilia, só desses, extinguia-se e era internado compulsivamente, ou obrigado a tratar-se. Temos leis que possibilitam isso tudo. Mas também temos cabeças que não percebem e que acham, mal ou bem, que o castiguinho é sempre a melhor solução. E depois lá andam a pôr os tais band aids de que falas porque não se conseguiu resolver coisa nenhuma.
obrigado pela resposta... mas nao foi isso que eu disse? se nao foi, tb assino
Quem me conhece sabe que não sou, a maior parte das vezes, de assumir posições radicais. Neste caso, nem disso se trata, pois nem consigo conceber outra forma de pensar. Se é como doentes (isto de rotular todos os desvios de comportamento como doença psiquiátrica…)que “essas coisas” são classificadas pela lei, e se esta já prevê o tratamento, que os tratem, num estabelecimento de alta segurança, para o resto da vida…
Mas qual doença qual quê? Esses estudos merecem tanta credibilidade como os que encaixaram a homosexualidade nesse rótulo que dá muito jeito para inferiorizar mas também para minimizar a culpa numa lavagem do hediondo que eu não papo de forma alguma.
Quando penso como lidar com pedófilos só me ocorre o Fidel.
E garanto que só faço a associação de ideias com base na nomenclatura.
bem isto comeca ficar serio e acho que aqui algumas coisas tenho de discordar. nao tenho competencia para saber se pode ou não ser considerado doença, mas em qualquer caso e como tudo acho justo que seja considerada a redenção da culpa (ou a cura da doença) e nesse caso será uma pessoa como qualquer um de nós. o perigo de um pedofilo nao e maior que outros presentes na sociedade. enclausuramos todos os perigosos? como se classifica? nao e isto em si perigoso?
Um gajo capaz de descobrir interesse sexual numa criança com cinco anos é muito fácil de classificar.
E devia ser fácil de identificar a olho nu (ou por força da lei, com retrato na net e tudo).
Mas eu nalgumas cenas assumo-me radical.
E não sou santo nenhum, se o ilustre colega me permite a beatitude do trocadilho...
por quem sois... (eu pelo BELEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEMMMMMMMMMMMMMMMMMM, claro)
mas isso entendo shark. agora tenho tanto receio disso como de ser radical. espero ter sido claro.
Ó Santo, não é que agora concordo contigo?
Shark, não sei se é doença ou não, mas se são criminosos como os outros porque ter tanto medo da reincidência? Parece que aqui é quase inevitável, enquanto que no assassino mais perverso se concebe a reabilitação.
Não me interessa um castigo por castigo. Posso ter raiva e ódio, que não sou santa como o santo, mas quero é que seja resolvida a questão do perigo. E não é enclausurar para a vida se outras soluções mais humanas forem possiveis.
E Shark meter pedófilos e homossexuais no mesmo saco é um pouco demais. Há desvios de comportamento sim, e no caso dos pedófilos é um desvio de comportamento "de facto", na homossexualidade a classificação de "desvio" tem reminiscências morais.
O que digo Shark é que se sabe quem são e se está provado que o são, para quê identificar, publicitar e não tratar? Para quê dizer atenção, perigo! e não resolver o perigo de forma sensata?
Teresa,
concordo contigo, claro.
Difícil é fazer entender que, por muito que custe, não se pode abrir precedentes, porque tornaríamos o sistema penal português numa bola de neve sem fim. Estava aberta a porta para a aplicação desses princípios a tudo e mais alguma coisa que os políticos demagógicos e sedentos de votos se lembrassem...
Convém não esquecer o que se passou com o regime nazi, porque o princípio foi o mesmo. E deu no que deu!
para o comentario acima:
clap clap clap clap
Parece que há por aqui muitas confusões... Começa por estarmos a misturar um sistema democrático, com divisão de poderes e onde as liberdades, direitos e garantias indivuduais estão constitucionalmente consagrados, com regimes totalitários, fascistas ou nacional socialistas.
Fala-se em "tratamentos compulsivos" e saltam com o nazismo? Que eu saiba morreram milhões de judeus sem necessidade de os darem como loucos. Bastou prendê-los.
O que digo é que se se prova, num tribunal,que um tipo é pedófilo e, se médicamente me dizem, que isso é um desvio de comportamento e poderá ser tratado, de que me vale mandar prendê-lo? Eu sei que quando sair está na mesma, que nestas coisas o castigo não faz nada - eles nem se "conformam" com ele, por o considerarem injusto. Não há aqui expiação de culpa porque não há culpa. Ou eles não sentem que haja.
Um tratamento viola mais a nossa liberdade que uma pena de prisão? Talvez. Acaba por ser mais intrusivo, mexe com a formação daquela pessoa, o seu Eu, mas se esse eu ameaça a sociedade não será que existe um valor maior que o justifica?
Não consigo viver com injustiças, ou descriminações, ou maldades, ou ódios. Mas também não gosto de faltas de inteligência e de contradições. Se acham que os pedófilos, mesmo depois de condenados e de a pena ter sido cumprida, continuam a ser um risco, e só isso justifica as outras medidas, isso quer dizer que se reconhece, à partida, que aquela pena não serviu para nada. Se é esse o caso, e parece que sim, volto à pergunta inicial - Esconder o Sol com a peneira?
O que vamos "tratar" de forma compulsiva? Ok a pedofilia. E que mais? Homosexualidade tambem? Caries dentárias? Para não conspurcar o ambiente por exemplo. Teresa, repito que percebo perfeitamente a vontade que dá de "tratar" da saúde (no sentido que quiseres) dos pedofilos. So peço imenso cuidado na generalização.
Ó santo o abuso de menores é um crime, pp (como dizemos) no código penal.
O que me parece é que a pena para esse crime não é a tal pena adequada. Se se sabe que é uma doença, ou um desvio, ou o que seja, porque não tratar?
Meter tudo o resto no mesmo saco são exageros e medos de papões que uma sociedade que realmente tivesse atingido a maioridade já não devia ter.
Duas notas:
1.º - quando falei no regime nazi, referia-me ao facto de também o Hitler lá ter ido parar democraticamente e as primeiras medidas redutoras da liberdade individual e discriminatórias terem sido aplaudidas pela maioria da população, ou seja, referia-me aos perigos da demagogia.
2.º - tratar um pedófilo como um inimputável e, portanto sujeito a tratamento compulsivo, provoca-me um sentimento dúbio, porque se por um lado eles serão doentes, por outro lado, será que alguma vez ficarão curados? E, se a resposta for negativa, vamos encarcerar para o resto da vida pessoas que, em todas as outras áreas da sua vida serão válidas, mas que por terem aquele desvio do comportamento serão compulsivamente afastadas da sociedade para o resto da vida? Seria, talvez, o único crime em Portugal com pena perpétua...
Angela
Até concordo contigo nisso da pena perpétua, mas já viste o que está a acontecer agora? Quer se queira ou não já estão a ser descriminados. O registo no cadastro ficará para o resto da vida e isso, como sabes, irá limitar bastante a sua vida social, profissional, cívica. E neste caso estamos a meter todos no mesmo embrulho, o pedófilo compulsivo e aquele que um dia resolveu ver como era e foi apanhado com a boca na botija. Não defendo encarceramentos, mas acho que se deve dar uma pena diferente, alternativa ou cumulativa, e a possibilidade de tratamento.Se leres a lei sobre a demência mental verás que já hoje se pode, compulsivamente, internar quem represente um perigo para a sociedade provocado por disturbios mentais. Isto assusta-me muito mais porque, infelizmente, dá muito poucas garantias de que a avaliação seja justa e objectiva.
Estes casos da pedofilia compulsiva lembram-me uma sentença (acordão, para quem percebe a diferença) com uns 15 anos e absolutamente inovadora no nosso sistema penal. Foi tão inovadora que até o pai do Código Penal da altura, o Figueiredo Dias, tinha dúvidas que fosse legal. Mas o certo é que a Relação e o Supremo a confirmaaram.
Um rapaz, não teria vinte anos na altura, embriagou-se, entrou em casa a meio da noite e, com um machado, matou a familia toda. Ninguém conseguia explicar o que tinha acontecido, nem ele, que ficou desesperado quando percebeu o que tinha feito. O caso foi julgado no Tribunal de Cantanhede e foi o Ministério Público que pediu exames psiquiátricos. Foi dado como provado que ele tinha uma alteração qualquer quimica, que o corpo dele não processava o alcool e que isso lhe provocava crises de extrema violencia com total corte com a realidade. O tribunal fez então o impensável. Condenou-o numa pena suspensa - era aqui que o FD tinha duvidas - com a obrigação de fazer tratamento e a proibição de beber uma gota de alcool que fosse. Resultou e até hoje não voltou a matar ninguém... se tivesse sido preso estaria agora a sair da cadeia com 2/3 da pena cumpridos e talvez quisesse festejar bebendo uns valentes copos...
Eu concordo contigo (o raio da deformação profissional condiciona a parte da opinião pessoal, disso tenho a certeza), em tudo o que dizes e também sei que não há decisões perfeitas, nem penas perfeitas. Por muito bonita que a teoria seja, já sabemos que a prática é sempre ligeiramente diferente.
Desde o início que discordei completamente com a discriminação que o CDS quer/queria fazer (e daí ter trazido a demagogia à baila) e se concordo, em princípio, com o tratamento compulsivo, como defendes, também este me traz algumas reticências.
Só isso.
Mas também não te sei dizer qual seria a pena ideal, até porque ideal seria não haver quem sofresse deste distúrbio (e muito menos quem tivesse que sofrer por causa de pedófilos)...
Limitações são aceitáveis (como impedimentos de exercício de certas profissões), mas tudo o que seja definitivo me causa algum mal-estar (nem que seja porque erros judiciários ainda são coisa comum...)
Mas, no essencial, penso que concordamos no raciocínio.
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