Dia do Pai

Faz hoje anos demais. Devia ser uma segunda-feira, princípio de semana, porque eu ia com o meu pai para Coimbra. No rádio, de minuto a minuto, faziam alusões ao Dia do Pai. Eu mantinha-me calada. O meu pai calado estava. O costume nas nossas viagens e tinhamos os dois muitos quilómetros daquela estrada, que comecei a ir com ele para Coimbra quando entrei para o Jardim Escola. Naquele dia para além de mudos fingiamo-nos também surdos. Tenho a certeza que tanto eu como ele gelávamos de cada vez que ouviamos o nome de mais um perfume para oferecer ao pai, mas nenhum de nós pestanejava sequer.
Trocámos as primeiras e únicas palavras quando o carro finalmente parou e o rádio se calou. Até sexta-feira. Boa semana.
Não, não éramos nada teimosos nem nada parecidos.

O meu pai morreu há seis anos. Tenho a certeza que se ele hoje aqui estivesse também não lhe desejava um bom Dia do Pai mas, merda!, tenho muitas saudades dele.

Há muitos anos também, o meu pai fez-me o retrato. O papel já está amarelado nas dobras e a letra vê-se mal, mas o que lá está escrito continua cirurgicamente exacto.
Nunca lhe dei uma prenda neste dia, mas hoje deixo-lhe aqui uma que ele me deu a mim. E dou-lhe o que nunca lhe dei - Pai, no que a mim dizia respeito, estava coberto de razão! (no resto ainda não tenho a certeza, que também não posso dar assim a razão toda de repente...)



Teresa vai,
Teresa vem.
Teresa mal,
Teresa bem.


Gente diz não,
Teresa diz sim.

Teresa que não,
Todos que sim.

Corre que corre,
Anda que anda,
Procura Teresa
Por toda a banda.

Procura-se a si
Até se encontrar.
Procura Teresa

Que vais gostar.

Pai

...............................................................................(obrigada gajo lindo por teres feito o milagre de pôr isto legível.)




8 comentários:

Ângela disse...

É por isso que convém estimar o que temos...
Hoje, exclusivamente para comemorar o dia, fui almoçar com o meu. Nunca se sabe quantos mais "Dia do Pai" poderemos ter...

cereja disse...

Ângela, para além de ser certíssimo almoçares com Ele, (é importante 'aproveitá-los' enquanto cá estão e não ficar depois cheias de remorsos para além das saudades) uma coisa a experiência me diz, é que eles continuam «cá» enquanto estiverem dentro de nós.
Este texto da Teresa diz isso, afinal. O pai dela está tão vivo que até nós o ficamos a conhecer. O meu está tão enraizado no meu coração (passe a pieguice) que continua «cá», quase todos os dias. Acompanhado por outros que não estão fisicamente, mas de quem me lembro quase todos os dias.
Claro que faz saudades. Ainda hoje senti saudades de uma amiga velhinha que partiu só há 8 dias... Isso é que não se pode evitar!

Anônimo disse...

o teu pai continua contigo, com um sorriso, claro que agora é uma presença implícita, tácita como vcs dizem, mas está

com o meu é assim

z

Anônimo disse...

:-)

Anônimo disse...

percebo muito bem, muito bem mesmo, o que escreves...

Anônimo disse...

Belo poema bela ideia de o publicares para todos nós. Não resolveu nada mas ficámos todos melhor depois de o ler.
JCFrancisco

issufo napakova disse...

Pois... eu conheci o pai da Teresa. Eu era amigo dele. O meu pai morreu três anos depois do pai da Teresa e eu ainda estou de luto. Morreu no dia do funeral da irmã Lúcia. Eu lembro-me perfeitamente do dia anterior e do dia da morte dele. E lembro-me por vários motivos. O primeiro foi porque fui a última pessoa da família com quem ele falou (no hospital). Fui visitá-lo, fora de horas (das 21 à 22h na véspera do dia em que ele morreu), e depois fui passear até às docas. Dez minutos depois de ter estado com o meu pai, já nas docas, telefonei à Teresa para lhe dar os parabéns pelo seu aniversário. No dia seguinte foi a vez da minha mãe me ligar: tinham-lhe dito que o meu pai estava mal... como era possível se eu o tinha deixado bem (dentro do possível) no dia anterior? Fui ao hospital, com a minha mulher, com a minha irmã, a minha filha Carolina e o meu irmão mais novo. A minha irmã chamou o capelão do hospital que lhe ministrou a Santa Unção e passados 2 ou 3 minutos ele morreu à nossa frente. E eu que lhe queria ter dito que gostava muito dele e já não lhe pude dizer. Gostava ter-lhe pedido desculpa por qualquer coisa que lhe tivesse feito e já não o pude fazer. E o meu pai também conhecia o pai da Teresa.

Teresa disse...

Não se conheciam só, eram amigos. E tinham uma paixão em comum - os livros.
E eu era amiga dele também. E ele meu. E não esqueço que morreu um dia a seguir aos meus anos. Nem que, nesse ano, e por acaso, estava lá em cima e pude ainda dizer-lhe adeus, antes de ter seguido para o alentejo dele.