Quando o telefone toca triste

Acabei de saber agora. Morreu um dos mais antigos amigos do meu pai.
Quando o meu pai fez 75 anos houve a última festa grande lá em casa. Festejaram-se quatro aniversários. O dele e os de mais três amigos. Tinham todos a mesma idade, conheciam-se desde sempre e a vida não lhes trocou caminhos, apesar de terem todos percursos diferentes. Um era engenheiro, outro cirurgião, outro advogado e mais um economista. Trabalharam em sítios diferentes e países diferentes, as mulheres não eram amigas, não faziamos pic-nics familiares ao fim de semana, não tinham o mesmo partido, nem o mesmo club de futebol, nem a mesma religião e os filhos não se casaram uns com os outros. Eram só amigos. Há setenta e cinco anos.
O meu pai morreu dois anos depois e hoje morreu mais um magnífico.
Para mim, este era a excepção na regra dos amigos do meu pai, porque era também o pai da minha melhor amiga. Também eu e ela nos conhecemos desde que nascemos - e nascemos com cinco dias de diferença uma da outra - e também eu e ela ainda somos amigas. Também temos percursos diferentes, partidos diferentes, profissões diferentes e vidas diferentes. Mas somos amigas há quase 45 anos. Não nos encontramos no Natal nem nas férias, os nossos filhos não se conhecem e vou falar com ela daqui a um pouco apesar de não me lembrar quando foi a última vez que nos vimos. Mas somos amigas.
E espero que tenhamos aprendido com os nossos pais que amigos assim é até ao fim da vida.
Hoje o meu pai e o pai dela hão-de estar juntos não sei muito bem onde, talvez na lua, onde a Clara diz que está o avô. E a discutirem, de certeza, que velhos hábitos não se mudam.
Senhores, espero que estejam bem, que nós ainda por cá nunca os vamos esquecer.

2 comentários:

Anônimo disse...

Estão bem concerteza,acredito que a olhar por nos como o meu avô!
Que para além de avô,um amigo à séria daqueles que nos faltam muitas vezes(mas que eu os tenho)
Quando oiço falar da morte,fico a pensar que não aproveitamos o que deveriamos e que fazemos mais mal que bem e quando queremos fazer ja é tarde!Ja partiram para longe fica somente a saudade jamais o esquecimento!

cereja disse...

Cabrinha, minha amiga, quando parte alguém, mesmo que já não seja novo, mesmo quando «se está à espera», o certo é que «nunca se está à espera»! Falo com muito conhecimento de causa, já perdi as pessoas mais importantes para mim (dos mais velhos, é certo!) mas estão sempre no que se pode dizer o meu coração. Como não acredito noutro lugar que não o deste mundo - deve ser consolador pensar-se diferente - agarro-me com força às memória e recordações. E elas têm-me valido. As pessoas que me eram queridas continuam comigo.

Ah, também tenho algumas amigas das «de sempre». Mesmo que se esteja meses sem nos falarmos, é bom saber que «estão lá».