Como eu gostava que os meus dez anos tivessem sido assim

- Mamã, está ali o A.
- Quem é o A.?
- O A. é o miúdo mais corajoso da escola.
- Ai é, que é que fez?
(confesso que imaginei-o com uma lagartixa na mão, ou a trepar ao telhado, ou mesmo a enfrentar um professor injusto...)
- o A. disse na frente da turma toda que gostava de ser menina.
(três glups em seco...)
- não achas que foi de muita coragem, mamã?
- claro que acho, mas como é que vocês reagiram?
- ninguém disse nada, que não havia nada para dizer.
- e não voltaram a abrir a boca?
- sim, já falámos nisso. Achamos todos que foi preciso coragem para dizer que queria ser menina e toda a gente o admira. É o mais corajoso da escola.

Pois é. Talvez estejamos a fazer alguma coisa certa. Talvez os nossos filhos, aqueles miúdos que não sabem brincar e só vêem televisão e querem é msn e sms e essas coisas todas horríveis que fazem e o que vai ser deles que no nosso tempo é que eramos educadinhos, esses mesmos, talvez eles estejam a crescer muito, mas muito, melhores que nós.

5 comentários:

sem-se-ver disse...

tiro o meu chapéu: a ela, e a ti.

Anônimo disse...

Eu quando disse à turma toda que gostava de ter uma das meninas ninguém me ligou... :-)

Subscrevo a sem-se-ver, pese embora o facto de chapéu deste lado não haver quem o veja.
Mas tiro as peúgas, vá...
Que este post é mesmo um sinal de esperança e justifica.

(Mãezona, hein?)

Teresa disse...

Miúdos fantásticos, não são? No nosso tempo a história teria acabado bem mal...

cereja disse...

Mesmo que isso se passe numa percentagem pequena é um belo sinal de esperança...

Digo isto porque infelizmente acho que não se pode bem generalizar. Sei de casos de bulling entre miúdos mesmo pequenos com base em histórias que parecem de há 50 anos. Contudo, talvez pela comunicação social, telenovelas, etc, é certo que hoje se fala de gays com uma naturalidade que deixariam os nossos avós completamente de olhos arregalados.

Claro que não estou a dizer que seja o caso! Contudo mostra mesmo que o mundo está a mudar e ser-se mulher não é já o estigma que foi há anos(e ainda é em muitos países).

Isabel disse...

Emiele,

Já nem estamos a falar de homossexualidade, mas sim de transgenderismo e/ou transsexualidade, que são temas bem mais tabu do que o primeiro! Sim, é um pequeno mas belo sinal de esperança... E, como dizes, não se pode generalizar.

É certo que as coisas não funcionam como há 50 anos atrás, não tentemos sequer comparar. No entanto, a verdade é que ainda vivemos numa sociedade bastante retrógrada, e isso reflecte-se bastante na atitude dos miúdos na escola, em geral. E até nem é preciso falar-se de homossexualidade, aqui há tempos uma amiga minha contou-me que os colegas do filho dela (de 5 anos) não o deixavam brincar com eles porque não usava sapatilhas Geox. Chegou-se à conclusão de que eram os pais que os incentivavam a tal comportamento. Estas coisas vêm de casa, na grande maioria dos casos, da educação que recebem.

Mas outra coisa que é certa é que a revolução dos media trouxe novos valores às pessoas e, como tal, um novo ideal de sociedade, que é algo maleável, alvo de constantes "alterações". Claro que ainda nos apresentam inúmeras calúnias e realçam estereótipos, mas não há dúvida de que tornaram diversos assuntos mais visíveis e objecto de discussão. Pode ser que devagarinho se vá ao sítio...