Nós e os outros

O Banco Alimentar contra a fome vai começar o seu habitual peditório. Mas, como este ano sabem que há pessoas que desenvolveram uma aversão à dita instituição, estão a fazer o trabalho deles e a tentar alterar a percepção pública. Até aqui, por mim tudo bem, respeito o trabalho bem feito, mesmo quando vem de tipos de marketing.

Antes de mais nada, este post não é sobre nenhuma declaração da senhora Jonet, nem sequer sobre o banco alimentar, é sim sobre um post ofensivo feito por uma senhora que claramente nada percebe de estatística e acha que a lógica deve ficar bem com batatas como acompanhamento.

Para referencia, podem ler o post Miserabilismo Português mas, para contexto, eu cito o mais relevante.

Diz a senhora Catarina Campos “Mas a maior parte das pessoas que tem surgido nestas manifestações não está nessa situação (de miséria). A maior parte, repito".
O que acho brilhante para um post que se quer a defender a solidariedade social. Então, pelos vistos eu sou hipócrita se for a uma manif protestar contra a "maconificação" do mercado, a extinção de oportunidades de crescimento profissional e a "cartelização" das empresas porque ainda tenho emprego? O facto de ver os meus colegas e amigos estarem genericamente todos pior não é causa para indignação porque eu, pessoalmente ainda tenho emprego? Se só me posso indignar com a miséria depois de ela me tocar na pele, ... bom, há uma história sobre isso que começa com "E eles vieram pelos Judeus, e eu não me insurgi porque não era Judeu".

"Não faltam a Zon ou a Meo, para poder ver as séries todas, os jogos, as notícias.
Ou as idas obrigatórias ao Optimus Alive, ao SuperBockSuperRock, ao RiR, ao Sudoeste."

Esta é igualmente brilhante e, ponho-a ao nível das velhas que reclamam com o celebre "e ainda dizem que não há dinheiro". É a falácia do terceiro excluído, negar que existe desemprego grave nos jovens à procura do primeiro emprego, que existem problemas graves nas camadas mais novas da população activa porque há outros jovens que podem ir a concertos? Se considerarmos "os outros" de um modo suficientemente grande, apanhamos, claro, imensos elementos que "provam" que aquilo é tudo um disparate. Afinal, eu acredito que os filhos (netos?) do Belmiro de Azevedo possam ir aos concertos todos que quiserem. Devem eles ficar em reclusão porque há pessoas que não têm que comer? É a senhora que participa naquele blog de algum modo censurável por andar a postar fotos em Paris quando há gente da geração dela que tem problemas graves? O facto de haver putos que podem ir a concertos, mesmo em tempos de crise é, quanto a mim, um elogio aos pais que se sacrificam de modo a poderem dar alguns luxos aos seus filhos.

Se há casos em que pessoas vão ao Alive e depois não têm dinheiro para comer? Bom, num Universo suficientemente grande conseguimos encontrar alguém que acredite ou faça praticamente tudo o que conseguimos conceber mas, tomar os casos isolados como norma é, mais do que um disparate, é um disparate puro.

Mas, a consistência continua, "Pois na minha opinião, inacreditável é a resposta dessa ínclita Geração: um boicote às Campanhas do Banco Alimentar." que é uma frase especialmente brilhante quando conjugada com um dos comentários onde referem que (à data) havia "700 e poucos" pessoas contra a Jonet no FB.
Até dou de barato tipos como o Louça pertencerem à mesma geração que os putos "à Rasca". Ó senhora, se 700 tipos em Portugal definem uma geração, então eu posso chama-la a si de puta? É que tenho a certeza que há mais de 700 senhoras dentro da sua geração que praticam essa profissão. Se é legitimo definirmos uma geração por uma amostra tão pequena, posso manda-la para a cadeia por assedio de menores? É que também tenho a certeza que houve mais de 700 indivíduos a cometerem este crime e que nasceram na mesma década em que a senhora nasceu. Ou será esta ideia totalmente parva, ofensiva e ridícula? Será que o Júnior tinha razão quando disse que era uma ideia fixe julgar um Homem pelo conteúdo do seu carácter?

Uma lei matemática é Universalmente válida, uma Lei Química é válida na Terra, à temperatura e pressão de laboratório, uma lei humana é valida no sentido estatístico, em que uma percentagem significativa da população faz ou segue algo. A história da amiga da vizinha não é exemplo de nada, é coscuvilhice e, 700 pessoas não marcam uma geração.

Nos próximos dias 1 e 2 vou dar para o banco alimentar, ... ou não, ... vou fazer o que a minha consciência (e carteira) me ditar. Não sou arrogante o suficiente para tentar impor a ninguém a minha moralzinha, ou para achar automaticamente que quem não fizer o que eu vou fazer é imediatamente uma besta sem valores de uma geração de merda (as palavras aqui são inteiramente minhas).

Eu percebo que, que a indignação é fogo que arde sem se ver (ainda mais que o amor) e, quando apanha um bocadinho de vento queima 100 hectares antes que alguém se aperceba. Por isso não altero a minha ideia previamente concebida da senhora Catarina Campos (genericamente boa) mas, este post deixou-me irritado o suficiente para escrever este e, calculista o suficiente para ter esperado umas semanas de “cool down”. Agora, ou param de me culpar pelas acções de gente cuja única coisa que têm a ver comigo é terem nascido na mesma década e/ou no mesmo país ou eu começo a pagar na mesma moeda.

Pensei em meter aqui o vídeo dos maridos das outras mas, o meu estômago não aguenta.

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