Era um torvelinho lá em casa. A minha mãe oferecia-me assinaturas d'A Cruzada, o meu pai do Tintin. A minha mãe ensinava-me o Pai Nosso e o meu pai matemática moderna, com uns cadernos da Gulbenkian que ainda hoje, se fechar os olhos, consigo ver. Quando a minha mãe me ofereceu um livrinho cheio de passarinhos e abelhas, já eu tinha papado as filas de trás da biblioteca do meu pai, e isso eram os Miller todos, as várias Emanuelle, uma tal de Fanny Hill, a Alemã que era cantora e escreveu as memórias, o Sade e as suas virgens, a "O" que virou história e tantos outros que já nem lembro (aos primeiros "herdei-os", que fazem parte de mim). No Verão dos meus dez anos o meu pai ofereceu-me "O meu pé de laranja lima" e o "Tom Saywer". Despachei-os depressa e a seguir li o Papillon, com umas contra capas de papel pardo a dizer " Casa Havaneza", sempre que a minha mãe se esquecia dele no sofá. Era o da casa da Rua da Fonte, a última dos Verões de aluguer, ao lado da fábrica dos bolos, onde comprava as "almofadas" recheadas de chantilly antes de ir para as aulas de natação.
Mais tarde, naquele jantar em que a minha mãe descreveu, minuciosamente, o casamento da princesa Diana, eu pensava na minha tarde na tenda de campismo e se o meu pai conseguiria ler na minha cara o que eu tinha estado a fazer. Nunca decorei a data. Achei sempre que se quisesse saber era só ver em que dia a tal outra que ficou princesa, mas na altura ainda não do povo, se tinha casado. E, no dia em que cheguei àquela casa de estudante onde vivia sozinha há muito, com os cigarros que tinha começado a fumar, e encontrei o meu pai e a minha mãe, numa visita surpresa, vi-o a ele a explicar qualquer coisa muito científica aos gajos que enchiam a sala e que ele tinha proibido de entrar lá "nem que fosse para pedir um lápis" e à minha mãe, lívida, encostada à parede da cozinha, a perguntar entre dentes "não tens medo de estar aqui sozinha com tantos homens?"
Saí assim, cabra e de serviço. Não gosto de vulgaridades e faltas de caridade, não tenho paciência para imbecis e não perdoo desonestidades intelectuais.
Mais tarde, naquele jantar em que a minha mãe descreveu, minuciosamente, o casamento da princesa Diana, eu pensava na minha tarde na tenda de campismo e se o meu pai conseguiria ler na minha cara o que eu tinha estado a fazer. Nunca decorei a data. Achei sempre que se quisesse saber era só ver em que dia a tal outra que ficou princesa, mas na altura ainda não do povo, se tinha casado. E, no dia em que cheguei àquela casa de estudante onde vivia sozinha há muito, com os cigarros que tinha começado a fumar, e encontrei o meu pai e a minha mãe, numa visita surpresa, vi-o a ele a explicar qualquer coisa muito científica aos gajos que enchiam a sala e que ele tinha proibido de entrar lá "nem que fosse para pedir um lápis" e à minha mãe, lívida, encostada à parede da cozinha, a perguntar entre dentes "não tens medo de estar aqui sozinha com tantos homens?"
Saí assim, cabra e de serviço. Não gosto de vulgaridades e faltas de caridade, não tenho paciência para imbecis e não perdoo desonestidades intelectuais.
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