É em alturas como esta, de completa sublimação, que me pesa saber-me incapaz de vos transmitir as imensas alegrias e a enorme tranquilidade que nos vem de uma saudável vida no campo.
As cigarras cantam sabemos que vai fazer calor, as amendoeiras têm flor estamos em Janeiro, na Páscoa mandam-nos plantar os tomateiros e as pimenteiras para termos saladas no Verão, as andorinhas voam baixo e tiramos a roupa da corda porque vai chover e a bacia da casa de banho entope e começamos a preparar-nos psicologicamente, porque é certo, certinho, vida de campo!…, o que nos espera um ou dois meses depois.
O tal relógio natural que nunca falha. A felicidade das certezas da vida.
Gente mais sofisticada e pouco dada a ruralidades reage levianamente a um ralo que teima em pedir passaporte à agua. Compra um líquido qualquer num frasco com ar aerodinâmico e uma etiqueta onde a palavra Super aparece várias vezes, cumpre rigorosamente as instruções e descansa.
Quando, a seguir, são as pias da loiça que entram em guerra com a água de lavar a salada uma gaija do norte pede a borracha, então não tens a borracha?!…, aquela coisa que desentope tudo? como se na borrachinha estivesse a garantia do futuro da humanidade, fazendo orelhas moucas ao que o senhor Papa está farto de dizer - a borracha não é solução, Gaija!
O nosso não, o não arrepiado de quem já sabe o que lá vem, dá direito a um olhar de esguelha acompanhado de uma ligeira explicação sobre o excelente funcionamento da coisa.
O problema volta a ser resolvido e a vida continua como se nas secretas entranhas não se estivesse a preparar o festival.
E um dia saímos do duche com espuma até ao meio das pernas e sabemos que a nossa sentença acabou de ser assinada. E mesmo sem olharmos para o calendário sabemos que é fim de semana ou, melhor ainda, é feriado, véspera de fim de semana. Nem o Santo Machado, homem de todas as horas e desenrascanços, nos vai valer e a solução é só uma – entrar em estado semi-hipnótico, focar a mente na secção de perfumes do Harrold's, enfiar umas luvas que se vão romper nos minutos a seguir e atirar-nos à fossa.
Não vou descrever como se levantam tampas de cimento que pesam toneladas, se grita desalmadamente quando as primeiras aranhas começam a fugir e nos passam por cima dos pés, se rebenta o silicone da caixa do chão da casa de banho e somos bafejadas com um lindo géiser de água que não cheira a baunilha, como se enfiam vinte metros de mangueira por uma ponta esperando que saia na outra, como se volta a puxar a mangueira já devidamente revestida por uma camada de, digamos…, uma camada de…, olhem, não posso dizer que a Gaija não gosta de pormenores, como se repete esta operação várias vezes ou como finalmente se consegue a limpeza dos intestinos da casa que teimam em obstipar na esperança que lhes demos o iogurte diário de bífidos activos.
Não! Não posso contar-vos. Isso era ensinar-vos como se faz e lá perdia eu a possibilidade de um dia poder levar-vos os olhos da cara para vos desenrascar num feriado.
Mas se pensam que o meu dia se resumiu ao doce cheiro de esgoto é porque não percebem nada da poda.
É que hoje é 1º de Maio isto aqui é Algarve e eu vivo no campo, já disse, não já?
Assim, e para minha imensa alegria, ao cheiro do esgoto, que até é agradável, começou a juntar-se, a meio da tarde, o cheirinho fantástico dos caracóis cozinhados. Das centenas de quilos de caracóis que por aqui todos fazem questão de comer no dia 1 de Maio em alegres pic-nics.
Fabuloso. Uma mistura irresistível. Um pot pourrit tão sedutor que até o cheiro da lixívia, que finalmente se colou em mim e em todos os cantos da casa, parece um aroma dos deuses.
Já agora, alguém sabe de um apartamentozinho vago na Reboleira ou no Cacém?
32 comentários:
(pensas que vou ler? tás certinha... tive direito à versão audio e ainda não consegui jantar!!!)
Gaija, ainda te falta a parte dos caracóis... esqueci-me de te contar a deliciosa parte dos caracóis...
Atão mas agora isto da prosa é paga ao metro?
'Tás a refilar? Tu nunca estás contente comigo, homem?
Ficarás mais animadinha se eu te disser que entendo todas as sensações e palavrinhas que escreveste???
Que num dia solarengo é bem possível que nos encontremos de roda de um qualquer copo gelado num qualquer alpendre rústico e possamos trocar ideias sobre estas experiências transcendentes?
É tão linda a vida no campo...
Peixa, só tu me podes compreender...
(mas se nesse tal dia, que deve estar muito próximo, me falares de fossas, eu mato-te!...)
Hoje estive quase para te desafiar mas depois fiquei de neura e fiquei a ver um filme no dvd que me fez pensar que era fantástico para as tuas miúdas (eu tenho um gaijo, pá...).
(ainda bem senão ia acabar dentro da dita cuja fossa também que eu sei que não era gaija para te abandonar atolada em... mangueira)
(e claro que nunca na vida falaríamos de fossas! claro que não! vamos falar de roseiras e cactos; de bichos da conta e borboletas; de hortas e de manias. Fossas? Definitivamente, não!)
A refilar contigo, Chefa???
Eu quero é saber se vou finalmente fazer fortuna!
Tu não me digas nada... a meio da fossa tocou o telefone, eu não podia atender porque não podia tocar em nada, mandei a xica e perdi a oportunidade, soube agora que devolvi a chamada, de conhecer uma nossa comentadora que estava por aqui.
Mas que vais fazer no Domingo? Ela já não vai estar, mas talvez tenhamos outras blogueiras por aqui...
Jogaste no Euromilhões? Não?! Então estás lixado...
E o 11 é meu...
(What's new?)
Vou amanhã para Lisboa e só volto Domingo depois de almoço.
No próximo fim-de-semana sou gaija livre (tirando teoria do direito civil, but who cares?), logo te desafio.
Vou buscar o 13...
Então vou tratar das coisas para o outro.
Teoria Geral do Direito Civil... Ora bem, podes levar o Código, não podes? Sabes como se colam páginas para se eles desfolharem não verem? Eu ensino-te!...
Oh meu amor, tive um curso intensivo no 1º semestre deste ano.
Acreditas que fiz o 1º ano sem cábulas? Era mesmo marrona, meu Deus... Bem que eles gozavam comigo por os meus códigos serem imaculados até Fevereiro deste ano...
Seja como for, vou ter mesmo de marrar. É oral...
Mas isso não invalida nenhuma combinação que ainda há muitas épocas para fazer Teoria...
tu não digas nada que eu fiz o curso todo sem quase copiar.
Aventurei-me duas vezes. A primeira foi mesmo em Direito das Obrigações. Tinha os princípios todos anotados no Código e a meio do exame resolvi ir ao índice procurar qualquer coisa. O assistente, Sampaio e Nora, não me esqueço, viu-me a usar o índice e veio dizer-me que era melhor pensar e ir lá sem essas facilidades... ora, o Código divide-se em... a senhora quer obrigações, portanto será.... e lá ia ele desfolhando o livro... Viu tudo. Tudinho. Mas, não sei bem porquê, fez de conta que as notas a lápis eram mesmo só as tais remissões de artigos que o regulamento permitia.
No 5º ano voltei a tentar a sorte. Tinha escolhido Direito Romano como opção porque tinha tido excelente nota no primeiro ano na parte I. Mal sabia que a II era uma estucha... Para o exame fotocopiei o imenso calhamaço do Sebastião Cruz, reduzi as fotocópias, fiz-lhes um furo na ponta e enfiei-as numa enorme argola dourada que até aí servia para me ornamentar a orelha.
Durante o exame tentei sacar a bendita cábula, mas tal era a atrapalhação que acabou no corredor do anfiteatro, aberta em leque, com o sacana do assistente a olhar para ela. Também me safei!
Copiar dá mesmo muito trabalho....
Eu não estou no campo, mas dei com o administrador a colar uns papéis no elevador, que não ía haver gás todo o fim de semana! Ainda fui a correr tomar duche, mas nada, já só havia água fria! Que bom.
E cozinhar, só se foram grelhados.
Eu conheço um gajo que tem uma Bimby e deve ter água quente. Se quiseres...
Oh pá, eu confesso que não tenho mesmo jeito para cabular... Os meus colegas dizem que cada vez que eu me atrevo a tentar, o até o administrador da universidade - em Lisboa - dá conta.
Além de que não sei cabular se não estudar. Não sei o que lá pôr. E se estudo não preciso de cábulas...
Sou um caso perdido...
Um giajo com uma bimby e água quente, nos dias que correm, é um achado...
Peixa, olha que nem tudo o que Bimba é ouro...
22, 11*2. Pimba!
Não me digas que o Gajo Cujo Nome Não Pode Ser Pronunciado comprou finalmente a Bimby...
E quanto a copiar, desisti no 1º ano, quando levei as folhas A4 onde tinha feito resumos da matéria e estava a tentar espreitá-las qd veio o Assistente olhar para mim. Não disse nada, mas levou-as e deu-me dez (era uma Teoria de não sei quê).
Mais tarde, levei para um teste de inglês um dicionário da minha irmã, que me começou a semear cábulas de Mineralogia de 3 cm, e a prof. apareceu logo, e eu "é da minha irmã, nem sabia que isso estava aí" , pobre Bymba...
Nem mais. Tem uma Bimba em casa, não quer outra coisa e são tremendamente felizes.
(lembras-te das cábulas dos tios que andavam em casa da avó? dezenas de rolinhos de papel enfiados nuns aramezitos. deviam ter mais trabalho a fazer as cábulas que a estudar...)
a grande vantagem das cábulas, particularmente dessas muito trabalhosas, é que se tornam inúteis: entretanto já se fixou tudo o que havia para fixar..
sempre cabulei. era excelente no copianço 'oral' (autêntica linguagem gestual apuradíssima entre colegas) e tb no escrito. folhas a4, qual quê. o mais simples era o menos óbvio.
a esta distância, sei que houve uma professora que fechou os olhos (história, 7º - antigo - ano); e imagino, da minha prática de profesora, que todos os outros o devam ter feito também. :)
corolário triste deste meu passado pouco glorioso - não há aluno que me escape quando está a tentar copiar. taditos.
(contudo, muito honesta como sempre, aviso-os disso mesmo antes do 1º teste que vão ter comigo. resulta. os poucos desgraçados que tentam concluem rapidamente que eu estava mesmo a falar verdade...)
eu gosto de caracois. sera que a bomby faz caracois? tenho de experimentar.
o banho frio faz bem gabs... dizem
e nao resisto a contar das coisas mais giras que ja ouvi sobre cabulas. tive um colega cego que testes ou exames tinha sempre uma confusao de folhas em cima da mesa... o teste mais as respostas mais os rascunhos, tudo em braille claro, mais as cabulas que os professores nao conseguiam distinguir. Uma das vezes a prof pergunta que folhas eram aquelas da esquerda e ele responde que sao rascunhos, ao que elea contrapoe... entao pq e q teem uma cor diferente. Azar...
Ok, Santo, não percebi nada, só que não tens Bimby, nem água quente!
O Mr.Bymbi (antes conhecido por Anónimo)prova a minha teoria que todos evoluem depois de "andarem" comigo. Compram coisas, vestem-se melhor, deixam de enfiar as camisas nas jeans...
qual o mal de enfiar camisas nas jeans?
e tenho agua quente, felizmente.
(pois, bimby nao tenho)
Nenhum. (ihihih)
ufa....
E já tenho gás, já posso tomar banho...
(... e é aqui que coloco rapidamente as mãos debaixo do rabiote e evito fazer a pergunta que se imponha!)
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